As agências reguladoras representam um importante marco na história do Brasil e desempenham papel fundamental para o desenvolvimento do país – uma vez que a estruturação do modelo regulatório ocorreu em um momento de expansão das grandes empresas estatais, desencadeando um crescimento acentuado e desproporcional, que fez com que as iniciativas privadas entrassem em ascensão. Esse movimento deu início à era de desestatização e conferiu ao Estado o papel de agente regulador.
Com isso, as agências reguladoras ganharam notoriedade e passaram a ser responsáveis por disciplinar, fiscalizar e controlar as atividades que norteiam os avanços econômico, político e social, regulamentando as ações ao operar na lógica administrativa – que deve primar pela imparcialidade ao mesmo tempo em que se mostra sensível às demandas dos agentes regulados e da população. Mais do que isso, as agências atuam como autarquias com regime especial e têm como função suprir eventuais falhas de mercado, a fim de manter a competitividade e estimular o crescimento da economia.
Atualmente, o Brasil conta com 10 agências reguladoras. Conheça cada uma delas:
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
Criada por meio da Lei 9.782/99, a Anvisa é responsável por atuar no controle sanitário dos mais diversos produtos nacionais e importados, bem como na fiscalização de portos, fronteiras e aeroportos. Suas principais atribuições envolvem o controle de qualquer produto ou serviço que possa causar riscos à saúde; a criação de normas e padrões de produtos; concessão de registros públicos, fiscalização e proibição de fabricação, distribuição e armazenamento de produtos que ofereçam riscos à saúde, interdição de estabelecimentos que não estão em conformidade com legislações voltadas à segurança e à saúde, entre outros.
A agência também é responsável por monitorar a mudança de tarifas de insumos da área da saúde e aprovar a criação de novos medicamentos, vacinas e pesquisas científicas. Sua atuação, com foco na eliminação ou mitigação de riscos à saúde, em todos os aspectos – que visa garantir que as organizações cumpram as normas vigentes ao passo em que assegura o direito à saúde de toda a população – é reconhecida internacionalmente.
Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL)
Instituída por meio da Lei 9.427, a ANEEL tem como missão “proporcionar condições favoráveis para que o mercado de energia elétrica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes e em benefício da sociedade”. Isso significa que o principal objetivo da agência é fiscalizar e regular a produção, transmissão, comercialização e distribuição de energia elétrica em todo o território brasileiro, com foco no aumento da competitividade das empresas e retorno de benefícios à população. O órgão é responsável, ainda, por implementar políticas no setor energético, realizar concessões, desenvolver metodologias de cálculo para as tarifas e fiscalizar todo o fornecimento de energia no país.
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)
A Anatel foi criada por meio da Lei Geral de Telecomunicações para promover o desenvolvimento das telecomunicações no Brasil, tornando-o moderno e eficiente para oferecer serviços adequados a toda a sociedade. Entre suas principais atribuições estão a implementação da política nacional de telecomunicações, a administração do espectro de radiofrequências e o uso de órbitas, o reconhecimento da certificação de produtos, além de mediar conflitos de interesses entre prestadoras de serviços de telecomunicações.
A agência é responsável, ainda, por fiscalizar e regular serviços como radiofrequência, telefonia móvel e fixa, satélite e banda larga – incluindo a nova tecnologia 5G – além de aspectos relacionados à concessão.
Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP)
Com o objetivo de garantir o abastecimento de combustíveis e atuar defesa dos interesses dos consumidores, a ANP é responsável por regular a exploração e produção de petróleo e gás, assim como autorizar a construção, operação e ampliação de refinarias de processamento e de armazenamento de gás natural e de produtos líquidos pelas empresas.
Suas atribuições se estendem a todo o processo de importação e exportação de petróleo e seus derivados e biocombustíveis, bem como à especificação da qualidade dos produtos e a regulamentação sobre a distribuição e revenda. Por fim, também cabe à agência fiscalizar usinas de produção de etanol e biodiesel e a promoção de leilões.
Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT)
A fim de fortalecer a regulamentação e fiscalização das atividades de prestação de serviços e de exploração da infraestrutura de transportes, a ANTT foi criada pela Lei nº 10.233 e é responsável pelo transporte ferroviário de passageiros e cargas ao longo do Sistema Nacional de Viação; pela a exploração da infraestrutura ferroviária e pelo transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros; assim como o transporte rodoviário de cargas e multimodal e a exploração da infraestrutura rodoviária federal. Além disso, também compete à agência a implementação de políticas públicas estabelecidas pelo Ministério dos Transportes.
Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC)
Criada por meio da Lei 11.182, a ANAC tem como objetivo regular e fiscalizar as operações e atividades da aviação civil e da infraestrutura aeronáutica e aeroportuária. Com isso, a agência busca promover a segurança da aviação e estimular a concorrência entre as empresas do setor. Dessa forma, a agência é responsável por estabelecer regras para o funcionamento da aviação civil no Brasil, atualizando e editando regulamentos técnicos; certificar aviões e componentes, oficinas de manutenção, empresas aéreas, escolas e profissionais de aviação; autorizar concessões para todos os setores, como companhias aéreas, operadores, aeroportos, entre outros; e fiscalizar toda a atividade para garantir níveis aceitáveis de segurança e qualidade na prestação dos serviços.
Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ)
Com o propósito de garantir a prestação de serviços de transporte aquaviário e de exploração da infraestrutura portuária e hidroviária adequadas à sociedade, a ANTAQ busca assegurar condições de competitividade e segurança de toda a movimentação de pessoas e bens por vias aquaviárias no país. Criada por meio da Lei 10.233, sua atuação é constituída pelas esferas de navegação fluvial, lacustre e de travessia; navegação de apoio marítimo, de apoio portuário, de cabotagem e de longo curso; portos organizados e as instalações portuárias neles localizadas; terminais de uso privado; estações de transbordo de carga; instalações portuárias públicas de pequeno porte; e instalações portuárias de turismo. Com isso, a agência visa o cumprimento de padrões de qualidade e eficiência e o respeito às normas instituídas para o setor.
Agência Nacional de Águas (ANA)
Instituída por meio da Lei 9.984/2000, a ANA é responsável, na esfera federal, por implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, conforme previsto pela Lei das Águas. As principais competências da agência são regular o uso de recursos hídricos, de rios e lagos de domínios da União; garantir a segurança de barragens; instituir normas de referência para a regulação dos serviços públicos de saneamento básico; e a prestação dos serviços públicos de irrigação e adução de água bruta. Além disso, também compete à ANA disseminar informações e implementar de normas que garantam o direito ao uso da água, minimizando efeitos de eventos críticos, como secas e inundações.
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
A ANS é a agência reguladora responsável por controlar, regular e fiscalizar a atuação de operadoras de planos médico e odontológico na esfera privada, assim como contribuir para o desenvolvimento de ações na área da saúde no país — possibilitando a competitividade do mercado ao mesmo tempo em que visa equilibrar os interesses entre os consumidores e as operadoras de planos de saúde. O órgão está inserido do contexto da saúde suplementar – atividade econômica que envolve a operação de planos e seguros de assistência médica, e tem como um de seus principais objetivos garantir o acesso dos cidadãos aos planos de saúde, bem como à assistência hospitalar.
Agência Nacional do Cinema (Ancine)
Criada por meio da Medida Provisória 2.2281/01, a Ancine tem como missão principal o desenvolvimento e a regulamentação do mercado audiovisual brasileiro. Sua atuação se dá, especialmente, em duas frentes: fomentando a produção nacional e incentivando o investimento privado, no mercado interno, e no apoio de coproduções e participações em festivais internacionais no contexto externo. Também cabe à agência apoiar projetos por meio de editais e seleções públicas, sendo responsável, ainda, pela fiscalização tributária dos procedimentos relacionados à Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine). Recentemente, a agência foi envolvida em debates acerca da tributação em serviços de Streaming.
Os desafios das agências reguladoras
Em 2019, foi publicada a Lei 13.848, conhecida como Lei das Agências Reguladoras. A legislação instituiu o novo marco legal das agências reguladoras a fim de atualizar as regras de gestão, organização, processo decisório e controle social das entidades. A lei também dispõe sobre a indicação de dirigentes, uniformizando o número de diretores, bem como prazos de mandato, além de criar requisitos técnicos que devem ser cumpridos por todos os indicados aos conselhos diretores. Fatores como a governança e transparência também foram instituídos com a nova lei.
No entanto, apesar da evidente relevância de seu papel para a sociedade, as agências ainda enfrentam grandes desafios. Quanto aos aspectos jurídicos, por exemplo, embora os órgãos sejam autarquias em regime especial, a autonomia conferida às agências não é, de fato, completa, especialmente por não possuírem independência total do poder político. Além disso, a própria estruturação das agências e todo o processo de controle e transparência também evoca os desafios que recaem sobre as agências. Com a transparência atrelada à realização de audiências e consultas públicas que geram pouco engajamento da sociedade, a discussão acaba por se dar, normalmente, com os agentes regulados – fato que demanda o aprimoramento da estruturação das agências.
Há, ainda, aspectos constitucionais: a compatibilidade com a Constituição Federal é, muitas vezes, questionada pela instituição de órgãos que exercem competências regulatórias com autonomia frente à Presidência da República e o Legislativo – sobretudo pelo fato de que a administração das agências, por meio de mandatos fixos, ocorre sem que os dirigentes tenham sido eleitos, o que pode causar um déficit democrático.
Dessa forma, apesar da matriz consolidada ao longo de pouco mais de 20 anos e de seu papel indispensável para a atividade econômica, social e política do país, as agências reguladoras seguem, ainda, como um modelo em constante evolução.