As campanhas de lobby, prática amplamente difundida em democracias consolidadas, são muitas vezes mal compreendidas no Brasil. A palavra "lobby" pode evocar uma ideia de manobras obscuras, mas, em essência, trata-se de um processo legítimo de influenciar decisões políticas em prol de interesses específicos.
Neste contexto, diferentes setores têm utilizado o lobby para moldar a legislação de acordo com seus objetivos. No Brasil, há diversos exemplos de campanhas de lobby que não apenas influenciaram o cenário político, mas também promoveram mudanças legislativas que impactaram profundamente a sociedade.
Exemplos de campanhas de lobby no Brasil
A atuação do lobby no Brasil, embora ainda não seja totalmente regulamentada, segue padrões de representação de interesses observados em outras democracias. Seja pela participação em audiências públicas, pela apresentação de estudos técnicos ou por meio de diálogos diretos com parlamentares, as campanhas de lobby são fundamentais no processo de construção de políticas públicas.
A seguir, apresentamos alguns exemplos emblemáticos de campanhas de lobby no Brasil, cada uma envolvendo diferentes setores e utilizando variadas estratégias para atingir seus objetivos.
Reforma da Previdência
A aprovação da Reforma da Previdência em 2019 foi fortemente influenciada por campanhas de lobby conduzidas por entidades empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
Essas associações buscavam moldar a reforma para garantir a sustentabilidade fiscal do sistema e, ao mesmo tempo, reduzir encargos trabalhistas para as empresas. As estratégias utilizadas incluíram o diálogo constante com parlamentares e a apresentação de estudos técnicos que mostravam a importância das mudanças para a economia brasileira.
Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)
Outro exemplo de campanha de lobby conduzida no Brasil foi a atuação de empresas de tecnologia e organizações de defesa do consumidor durante a tramitação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Enquanto o setor empresarial buscava garantir que a nova legislação não inviabilizasse suas operações, as organizações de consumidores pressionavam por uma lei que protegesse efetivamente a privacidade dos usuários.
O resultado foi um equilíbrio entre interesses, com a LGPD adotando medidas que garantem a proteção dos dados pessoais, mas também oferecendo flexibilidade para empresas se adequarem às novas regras.
Marco Civil da Internet
O Marco Civil da Internet é um exemplo clássico de como diferentes setores podem influenciar uma legislação de grande impacto. Durante sua elaboração, empresas de telecomunicações, provedores de serviços de internet e organizações da sociedade civil atuaram ativamente para moldar o texto final da lei.
O lobby das empresas de telecomunicações, por exemplo, buscava flexibilizar a neutralidade da rede, enquanto organizações da sociedade civil defendiam uma internet livre e aberta. O resultado foi uma legislação pioneira, que equilibrou direitos dos consumidores e interesses empresariais.
Regulamentação dos Aplicativos de Transporte
Com o surgimento de aplicativos de transporte como Uber e 99, um novo cenário de lobby se formou no Brasil. Empresas de tecnologia se mobilizaram para evitar que regulamentações rígidas inviabilizassem seus modelos de negócio, enquanto sindicatos de taxistas pressionavam por regras mais severas que equilibrassem a concorrência.
A atuação dessas empresas no Congresso incluiu reuniões com parlamentares e a realização de campanhas de comunicação para sensibilizar a opinião pública sobre os benefícios dos aplicativos de transporte.
Reforma Trabalhista
A Reforma Trabalhista de 2017 foi outro exemplo de uma intensa campanha de lobby no Brasil. Entidades como a Confederação Nacional do Comércio (CNC) e a CNI atuaram para garantir que as mudanças nas leis trabalhistas favorecessem a flexibilidade nas relações de trabalho.
Em contrapartida, sindicatos de trabalhadores pressionaram por medidas que garantissem a proteção dos direitos trabalhistas. O lobby das entidades empresariais foi bem-sucedido, resultando em uma reforma que introduziu novas formas de contratação e flexibilizou a negociação entre patrões e empregados.
Legislação de Agrotóxicos
Sancionada em dezembro de 2023, a Lei dos Agrotóxicos (Lei 14.785/2023) atualiza as regras para aprovação, comercialização e uso de agrotóxicos, atendendo às demandas do setor agropecuário, que argumentava que as normas anteriores, vigentes desde 1989, eram obsoletas e prejudicavam a competitividade do agronegócio brasileiro.
Entre as mudanças, destaca-se a redução dos prazos para o registro de novos produtos, que agora pode ser concluído em até 24 meses, com a possibilidade de registros temporários para produtos já utilizados em países da OCDE. Essa flexibilização foi impulsionada por entidades como a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que defenderam a necessidade de modernizar as regras para tornar o setor mais competitivo.
Por outro lado, a nova lei gerou fortes reações contrárias de ambientalistas, partidos políticos e organizações de saúde, que questionam a segurança dessas mudanças. Essa campanha de lobby demonstra o peso que o setor agropecuário tem na formulação de políticas públicas no Brasil, ao mesmo tempo que ressalta os desafios de equilibrar crescimento econômico com proteção ambiental e à saúde.
Desoneração da Folha de Pagamento
A desoneração da folha de pagamento, instituída para aliviar encargos sobre setores que empregam grandes quantidades de trabalhadores, foi tema de intensas campanhas de lobby nos últimos anos. A Lei 14.973, de 2024, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, traz uma solução intermediária após longas negociações entre governo, Congresso Nacional e o setor empresarial. A legislação mantém a desoneração integral até o final de 2024, mas estabelece uma reoneração gradual a partir de 2025, com alíquotas progressivas que atingirão 20% em 2027.
Desde 2012, a política de desoneração permitiu que empresas reduzissem a carga tributária sobre a folha de pagamento, favorecendo a manutenção de empregos. No entanto, as perdas de arrecadação para o governo motivaram a busca por um equilíbrio, levando a um debate entre o setor produtivo e o Executivo, com destaque para a mobilização de entidades empresariais em defesa da continuidade da desoneração.
Esta campanha de lobby demonstra o impacto do diálogo entre setores produtivos e governo, moldando uma política pública importante para a economia brasileira.
Legalização dos Jogos de Azar
A legalização dos jogos de azar no Brasil, especialmente com o avanço das apostas esportivas online, tem gerado intenso debate em 2024. Embora as apostas tenham sido legalizadas em 2018, o setor cresceu de forma desordenada, resultando em preocupações sobre os impactos econômicos e sociais.
Estudos recentes mostram que o mercado de apostas online movimenta bilhões de reais, e famílias têm enfrentado endividamento significativo devido à facilidade de acesso e à falta de regulamentação adequada.
O governo brasileiro está em fase de implementar uma regulamentação mais rígida, com foco na fiscalização e tributação dessas atividades. A partir de 2025, as empresas de apostas deverão pagar uma licença de R$30 milhões para operar legalmente no país, e medidas estão sendo adotadas para bloquear empresas que não cumprem as novas regras.
Essa mudança é resultado de uma pressão crescente sobre o governo para controlar os efeitos negativos do setor, como o vício em jogos e o aumento da inadimplência entre os jogadores.
Estratégias de lobby no Brasil
As campanhas de lobby no Brasil utilizam diversas estratégias para influenciar o processo legislativo. Entre as mais comuns, destacam-se:
Reuniões com parlamentares: o diálogo direto com deputados e senadores permite que as entidades expliquem seus pontos de vista e influenciem a formulação de projetos de lei.
Participação em audiências públicas: as audiências públicas são momentos chave para que as organizações exponham suas propostas e façam parte do debate legislativo.
Campanhas de comunicação: muitas campanhas de lobby, ou mais conhecidas como ações da área de public affairs, também utilizam a mídia e as redes sociais para sensibilizar a opinião pública e gerar apoio popular para suas causas.
Como a Inteligov pode apoiar campanha de lobby
Diante da complexidade do cenário legislativo brasileiro, a Inteligov surge como uma ferramenta essencial para otimizar e aprimorar as estratégias de campanhas de lobby. A plataforma permite o monitoramento em tempo real de projetos de lei, alterações regulatórias e movimentações políticas que podem impactar diretamente setores específicos.
Com a Inteligov, profissionais de relações governamentais podem antecipar mudanças legislativas e ajustar suas ações de acordo com o contexto político. Além disso, a plataforma oferece funcionalidades como a Matriz de Relevância e o Termômetro, que auxiliam na identificação de quais propostas têm maior probabilidade de serem aprovadas, permitindo um planejamento estratégico mais assertivo.
Essas ferramentas são fundamentais para que campanhas de lobby sejam realizadas com base em dados concretos, garantindo maior efetividade nas ações de influência e na defesa de interesses.